Até recentemente (em 2017), nunca imaginaria ser possível encontrar Jesus Cristo pessoalmente neste mundo. A seguir relato essa experiência de fé e como minha vida mudou radicalmente após este encontro.
Tenho 32 anos, todos eles vividos como católico praticante. Batizado, crismado e casado; ex coroinha/acólito e catequista. Atualmente integrante do movimento OVISA. Posso dizer que sempre busquei a Deus, graças aos valores religiosos transmitidos por meus pais desde cedo.
Apesar de toda religiosidade, um pouco acima da média, confesso, minha vida sempre foi focada em meus projetos, sonhos e desejos pessoais. Sempre amei meus próximos (principalmente minha esposa), mas nunca tinha aplicado literalmente o evangelho na minha vida.
Após encontrar Jesus, tudo mudou. Hoje meus antigos projetos e sonhos são uma distante memória infantil. Isso porque a Verdade é capaz de ordenar todas as coisas em nossa vida, que antes foram totalmente desorganizadas pelo mundo. Como uma criança perdida sem os pais em meio a multidão: assim me sentia antes deste encontro.
O Início
Tudo começou em 22 de julho de 2017 com a notícia que a mãe de minha esposa, Rita, ( e minha mãe na lei como dizem sabiamente os americanos) sofreu um AVC. Estava em coma no hospital na cidade de Queluz-SP. Fomos acordados pela manhã com minha tia chamando para dar a triste notícia. Ao vê-la chamando tão cedo, sabíamos imediatamente que algo não estava certo.
A seguir começava uma verdadeira batalha pela sobrevivência de dona Rita. Logo na manhã após a internação, foi transferida para o hospital de nossa cidade, Cruzeiro-SP. Aqui já começava a ação da providência divina, pois o hospital fica há apenas 5 minutos à pé de nossa residência.
No início os médicos tiveram uma certa dificuldade para diagnosticar o coma. Depois de ser analisada por diversos médicos, com exames avançados, a confirmação da morte cerebral veio pelas mãos de um respeitado neurologista de nossa região.
No momento que recebemos a notícia da morte cerebral, nosso chão (meu e de minha esposa) caiu. Este é um termo que muitas pessoas utilizam fora de contexto, hoje percebo. Naquele momento, uma parte muito importante de nós (especialmente de minha esposa), acabara de morrer.
Confirmada a morte cerebral devido a um AVC hemorrágico no tronco encefálico, recebemos junto ao diagnóstico o prognóstico do corpo: paciente com vida hospitalar longa. Fomos para o carro chorando muito naquela noite, de forma descontrolada.
Enquanto chorávamos porém, sem ter muita noção do que estávamos fazendo em meio à dor, meio que por um reflexo involuntário, clamamos o Espírito Santo de Deus cantando uma música em meio às lágrimas e a um sentimento profundo de vazio, um tipo de morte que nunca havia experimentado até então.
Uma coisa que me marcou muito naquele momento do diagnóstico, foi a frieza como tudo se desenrola em um hospital. Pessoalmente nunca tinha vivido essa realidade e naquela hora de fragilidade, sentimentos de revolta, ira, medo e orgulho brotaram como nunca dentro de mim.
Mas alguma coisa havia mudado drasticamente em nós depois daquela oração no carro: de repente não acreditávamos mais na morte anunciada de dona Rita.
Vivendo no hospital
Começamos então as visitas diárias à emergência da Santa Casa de Cruzeiro durante o período de internação. O ideal seria que ela fosse enviada imediatamente para a UTI, mas como esta se encontrava cheia, não foi possível a transferência por várias semanas.
Durante esse tempo, ela permaneceu internada em coma e podíamos apenas visitá-la em curtos períodos pré-definidos e rigidamente controlados. Nossa rotina diária virou do avesso. Passamos a praticamente morar no hospital. Ficávamos dia e noite à espera de notícias e em busca de um caminho para tira-la daquele sofrimento.
Depois do batismo no Espírito (como hoje entendo a passagem no carro), comecei a sentir um profundo desejo de oração naquele hospital. Durante vários momentos do dia rezava o terço na porta da emergência, pedindo encarecidamente a Deus pela dona Rita e pelas diversas outras pessoas que sofriam naquele hospital.
Certa vez, logo nos primeiros dias de internação na emergência, vi Nossa Senhora correndo pelo corredor e entrando com grande pressa no quarto onde dona Rita se encontrava. Esse ver não foi com olhos da carne e sim com os olhos da fé (que até então nem sabia que existia). Porém a visão era muito mais clara e viva do que os meu olhos carnais poderiam jamais conceber.
Em outra ocasião, enquanto rezava o terço no corredor, um homem, imobilizado pela equipe de socorro, se debatia com furor e violência em um dos quartos. Seus gritos eram tão altos que todos (dezenas de pessoas) pararam para ouvir com grande angústia o que acontecia. Após concluir o terço em intenção daquela pessoa, imediatamente os gritos cessaram e uma grande paz tomou o lugar.
Inúmeras outras situações aconteceram onde pude ver o poder de Deus agindo de forma descarada naquela lugar pela interseção do terço de Nossa Senhora.
Um Tesouro Escondido
Depois de vários dias (15 dias se não me engano), aguardando pacientemente (em coma) por uma vaga na UTI, finalmente dona Rita foi transferida.
Novamente nossa vida mudou, junto com os novos horários de visita. Nesta época já estava identificando nela e naquela situação, o Cristo pregado na Cruz. Começava a sentir mais do que um desejo profundo de oração: brotava em meu coração a vontade de abandonar tudo para simplesmente cuidar dela e de minha esposa.
Neste tempo já estava colocando meu negócio no piloto automático, fazendo apenas o básico e delegando tudo para minha equipe. Fui abandonando todos os meus planos e projetos, me endividando cada vez mais e gastando muito para viver ao lado delas no hospital.
Não sabíamos quanto aquilo tudo poderia durar: anos, diziam os médicos. Na UTI ela passou nas mãos de muitos profissionais. Alguns diziam que deveríamos nos preparar para a doação dos órgãos. Outros que ela iria para a casa e deveríamos providenciar o tal do Home Care. Nos perguntavam qual era nosso plano de saúde e qual empresa de Home Care iria cuidar dela.
Esse capítulo me gerou muita angústia, pois mesmo que vendesse tudo não seria capaz de arcar com os custos estimados de manutenção destes cuidados sem um plano de saúde: algo entre 10 e 15 mil reais. Por mês.
Mas, apesar de tudo, não perdemos a esperança e insistimos na oração.
Durante sua estadia na UTI, houve uma lenta recuperação física (respiração, pressão, glicose, etc), embora sem progressos neurológicos. Credito esta melhora a um hábito que desenvolvemos na UTI, que mais tarde viria a fazer muito sentido, a oração diária do Terço da Divina Misericórdia por volta das 15 horas ao lado dela no leito. Mesmo sem nenhuma resposta por parte dela, rezávamos todos os dias. Além disto, liamos o evangelho do dia para ela.
Mediante tudo isso, o abandono pelas coisas do mundo por qual passei foi completo, sem esperança de volta. Pois, para todos os lados que olhávamos com os olhos da carne, não havia esperança neste mundo: no dinheiro, na medicina, na ciência, na família, no cônjuge: nada era capaz de reverter aquela situação, nem mesmo melhora-lá um milímetro que fosse.
O que me iluminou foi uma parábola que Jesus contou: a Parábola do Tesouro Escondido em Mateus 13, 44-51.
Percebi graças ao Espírito Santo que aquela era a oportunidade de minha vida. A enfermidade de dona Rita, o desespero meu e de minha esposa. As dificuldades que enfrentávamos. Enterrado ali estava o Reino dos Céus.
Aqui minha ambição desmedida, que nutri durante toda minha vida, de ser rico, encontrou seu verdadeiro sentido. Fui saciado! E fiz o que o homem da parábola fez: vendi tudo (tempo, bens, sonhos, orgulho, status social, tudo que tinha) para comprar o campo.
Após comprar o campo ao preço do abandono de mim mesmo, descobri que o pote de ouro era a graça santificante de Deus. Essa graça é impossível definir em palavras. Mas posso dizer que é um estado de consciência constante e permanente em Deus, que se renova a cada encontro com Ele, seja na oração, em uma ação de caridade ou num irmão que sofre. A satisfação completa de todos os anseios e uma paz profunda e completa.
A Recompensa
Após uma longa e dolorosa estadia na UTI, onde os médicos procuravam estabilizar o quadro clínico de dona Rita, que era muito grave devido às sequelas do AVC, fomos enviados para o isolamento do hospital, com previsão de ir para o quarto.
Me lembro que isso foi uma grande vitória para nós. Em minhas orações, no meu coração, eu acreditava verdadeiramente em uma recuperação completa de dona Rita. Certa vez tive uma visão de fé ( não sei explicar isto ao certo), onde ela cuidava de um neto. Minha esperança era esta: que ela se recuperaria por completo.
No isolamento, eu e minha esposa passamos alguns dos piores dias de nossas vidas. Lá teríamos que ficar 24 horas ao lado dela. Claro que não fomos avisados com antecedência sobre isso e logo na primeira madrugada minha esposa teve que passar a noite com ela.
Esta foi a primeira noite em 6 anos de casamento que dormimos separados. Foi bem estranho, não sabia ao certo o que fazer sem minha esposa ao meu lado na cama naquela noite.
No dia seguinte assumi o lugar dela e passei o dia no isolamento com ela enquanto minha esposa dormia. E assim foram os próximos dias daquela semana. Um revezamento insano, onde dormíamos e ficávamos no hospital.
Durante algumas noites, pagávamos pessoas estranhas para ficar com ela. Foi uma experiência triste pois não tínhamos em quem confiar (ainda) e não podíamos ficar com ela.
Um momento que me marcou muito nesta fase do isolamento foi uma conversa que tive com a médica no primeiro dia pela manhã. Eu disse a ela que dona Rita permanecia em coma piscando de forma descontrolada. Um piscar que não chegava a abrir os olhos, ou seja, piscando de olhos fechados.
Depois de ler muito na internet sobre aquilo, cheguei a brilhante conclusão que as piscadas não tinham padrões neurológicos, ou qualquer sentido. Ela me olhou bem e disse: talvez tenham e não saibamos.
Essas piscadas descontroladas começaram nesta época do isolamento, depois da UTI, quando a sedação começou a diminuir. Foi um sinal dado por Deus a nós: ela não estava morta.
Desafios
Começava novamente grandes mudanças em nossas vidas. Eu tive que abandonar de vez meu trabalho nesta época, visto que grande parte dos problemas do dia eram em função de dona Rita.
Como ela precisava de cuidados paliativos por estar em coma, eu e minha esposa tínhamos que lidar com diversos desafios: desde um simples banho e trocas de fraldas juntamente com a equipe do hospital, até remédios, pomadas, cremes, fraudas, mais remédios, enfermeiros, gastos e mais gastos, etc.
Além dos desafios lá no hospital, tínhamos que cuidar de nossa vida aqui fora: ficávamos 24 horas por dia ao lado dela revezando, eu, minha esposa ou alguma pessoa de confiança. Não conseguíamos muitas vezes cumprir tarefas básicas, como pagar contas, dormir, limpar a casa, tomar banho, fazer almoço, etc.
Assim, dona Rita foi transferida para o quarto mesmo estando num quadro que demandava constante aspiração devido a secreção, trocas de curativos (a UTI deixara grandes escaras, que viriam a piorar muito) e fisioterapia respiratória avançada.
Na época achei um absurdo o hospital fazer tal coisa. Porém hoje entendo que não havia nada que pudesse ser feito. Logo, entre todas as dificuldades, gerenciar minhas expectativas sobre aquele lugar e as pessoas que nos ajudavam foi o maior desafio que passei em minha vida.
Esperava que a medicina e o sistema de saúde pudessem resolver o problema (como se tudo isso fosse um problema a ser resolvido). Porém eles não resolviam nada. Pelo contrário, pareciam piorar algumas coisas. Cheguei ao ponto de me questionar se tinha sido uma boa ideia ter dado entrada com ela no hospital.
Hoje vejo que na época nutria uma cresça desmedida em remédios, médicos hospitais. Os desafios superados com a Graça, me geraram uma grande libertação e uma nova esperança, verdadeira, em Deus, não nas coisas passageiras deste mundo.